quinta-feira, 18 de setembro de 2008

LDB, PCNs e Tendências Curriculares

LDB, PCNs e Tendências Curriculares – Uma interpretação à luz dos movimentos sociais
Maria Rúbia Alves Marques

A tipologia dos espaços-tempos da cidadania
Boaventura Santos (2001) apresenta um modelo teórico dos espaços estruturais. Segundo ele, o contributo dessa teorização pós-moderna está nos múltiplos lugares de opressão nas sociedades capitalistas e das interligações entre elas.
Anteriormente, tais constelações de relações regulatórias e emancipatórias foram alocadas pelo autor em quatro espaços-tempo: o espaço-tempo mundial, o espaço-tempo domestico, o espaço-tempo da produção e o espaço-tempo da cidadania. Posteriormente Santos amplia sua teorização de modo a incluir mais dois espaços estruturais: o espaço de mercado e espaço da comunidade.
O espaço-tempo mundial é o mais abrangente, pois, a eles estão associadas as questões ligadas à explosão demográfica, à globalização da economia e à degradação ambiental, o mesmo abrange os efeitos de todos os demais espaços estruturais.
O autor se refere aos seis espaços estruturais que expressão os embates em torno do poder, do direito e do conhecimento. Tem-se, portanto, um modelo de estrutura-ação das sociedade capitalistas contemporâneas .
Os seis espaço estruturais se apresentam de formas diferentes no centro, na periferia e na semiperiferia do sistema mundial devido às diferente trajetórias históricas em direção à modernidade ocidental .
Se os espaços estruturais são de fato conjuntos de relações sociais, são também conjuntos de relações de conhecimentos.
A analise sociológica e epistemológica de Santos se pauta na oposição entre os paradigmas Moderno e Pós-moderno, entre o velho paradigma e novo: o conhecimento e a subjetividade.
O Estado e o poder na pós-modernidade
Saber qual a origem da abordagem de Santos leva a uma peculiar interpretação da questão do poder do Estado nos sentidos macro ou soberano. Interpretação que leva inicialmente em conta a concepção liberal e a concepção foucaultiana de poder.
O autor faz um alerta metodológico quanto às concepções contraditórias de Estado que parecem radicar na nebulosidade do próprio objeto de analise. Assim seriam três as causas dessa nebulosidade: a utilização de quadros conceituais desenvolvidos no século XIX para analisar transformações do século XX; a continuação da predominância do Estado-nação como unidade de análise e suporte lógico da investigação; a influencia do “viés do centrocentrismo” na teoria sociológica, inadequado às analises das experiências das sociedades periféricas e semiperifericas.
As interpretações a cerca da relação entre Estado e sociedade civil estão associadas aos diferentes conceitos de poder: a concepção liberal e a concepção foucaultiana .O paradigma da teoria liberal identifica o poder social com o poder social com o poder do Estado. Essa concepção da sociedade civil com “pluralidade atomística de interesses privados” domina, hoje, o discurso político nas sociedades capitalistas. A teoria foucaultiana destaca o poder típico da Modernidade, emergente a partir do século XVIII, tratando-se de uma forma de poder bem mais disseminada e eficaz, o poder disciplinar.
Somos então confrontados por um terceiro conceito ou “alternativa conceitual” de poder, como “uma via intermediária entre a concepção liberal e a concepção foucaultiana”, que é considerada a conformação político-cultural Pós-moderna, pautada na interseção crescente entre o tempo da vida (relações sociais de reprodução social) e o tempo do trabalho produtivo (relações sociais da produção).
Em tese, os espaços-tempos constituem os loci das relações de poder na Pós-modernidade, onde se configuram os atuais problemas e/ou dilemas sociais, bem como os sujeitos ou agentes envolvidos com suas respectivas utopias ou proposta de “soluções fundamentais”. Em todo caso, os Novos Movimentos Sociais (NMSs) são o ponto de referência, tanto teórico-filosófico e epistemológico, com prático-político e pedagógico da cidadania.
Cultura, Educação e Cidadania
O termo cidadania comporta uma riqueza de possibilidades, pois representa, ao mesmo tempo: um objetivo político, quando associado a ideais éticos e utópicos de uma sociedade mais justa e democrática; um processo histórico quando expressa o exercício de construção de um projeto social; um recurso analítico ou teórico, filosófico e epistemológico, enquanto conceito ou categoria para analisar os aspectos da síntese complexa que articula a história, a subjetividade e a educação.
Quando falamos de cidadania em nossos discursos e práticas escolares nos referindo à finalidade de formar o cidadão crítico e consciente estamos falando em primeiro lugar, de um ponto de vista filosófico, que a cidadania se refere a um processo contínuo e inacabado de qualificação da vida dos homens, sendo, portanto, um processo de humanização. A cidadania se define mais pelas práticas sociais, pelos embates que se travam por crescente qualificação da vida.
Em segundo lugar, de um ponto de vista político-cultural, que os Novos Movimentos Sociais constituem a expressão, por excelência, do exercício da cidadania nos tempos atuais da pós-modernidade.
Em terceiro lugar, de um ponto de vista epistemológico, a emergência dos Novos Movimentos Sociais configura um cenário cultural, plural e multicultural.
Em quarto lugar, de um ponto de vista sociológico, endossamos que o exercício da cidadania, ou as relações sociais de poder, estão se dando, atualmente naqueles quatro espaços-tempo delineados por Santos. Trata-se de um processo inerentemente controverso, antagônico e contraditório, já que pautado por movimentos de qualificação e de desqualificação.
Em quinto lugar, de um ponto de vista pedagógico-escolar, a função da escola na conquista da cidadania é como mediadora da construção dessa condição de cidadania, contribuindo para a integração dos homens nessa tríplice universo: no universo das relações econômicas, no universo das relações intencionais e no universo das relações políticas.
Tendências curriculares, temáticas e metodológicas
No que diz respeito à LDB, em seu título I, da Educação, destaca-se o que se considera espaços formativos e, portanto, pedagógicos:
Art. 1º. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida
familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
...
§ 2º. A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.
No que se refere aos conteúdos do ensino propriamente ditos, no Capítulo II:
Art. 26º. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional
comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por
uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e da clientela.
...
§ 4º. O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes
culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena,
africana e européia.
No que diz respeito ao PCNs, a despeito de pertinentes críticas ao contexto das políticas públicas que lhes deram origem e aos processos de sua elaboração e implementação entre os professores do ensino fundamental e médio pressupomos que um avanço pode ser verificado nos princípios de flexibilidade curricular, interdisciplinaridade e transversalidade, presentes, sobretudo, nas propostas do Temas Transversais para o ensino. Estes podem ser considerados desdobramentos temáticos e metodológicos para a escola, da perspectiva histórica, epistemológica e pedagógica e pós-moderna.
Os Temas Transversais, propostos tanto para as series iniciais tanto para o ciclo de 5ª a 8ª série do ensino fundamental, são ética, pluralidade cultural, meio ambiente, saúde e orientação sexual, e trabalho e consumo.
Trata-se de temas que fazem parte de uma nova agenda de conteúdos, adequados aos complexos problemas e necessidades colocados pelo mundo atual.
A finalidade última dos Temas Transversais é que os alunos possam desenvolver a capacidade de posicionar-se das questões que interferem na vida coletiva, superar a indiferença e intervir de forma responsável.
Quanto aos desdobramentos epistemológicos e metodológicos, tem-se a ênfase nos aspectos interdisciplinares e transversais. A interdisciplinaridade refere-se a uma relação entre disciplinas. A transversalidade diz respeito a possibilidade de se estabelecer uma relação entre aprender na realidade e da realidade de conhecimentos teoricamente sistematizados e as questões da vida real.

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